' E assim o tempo vai passando...

sexta-feira, 29 de junho de 2012


Ei garoto, to caindo fora falo?!
Ah nem vem com esse seu melodrama barato para o meu lado, não vai adiantar nada.
Não é que eu não goste mais de você, eu até gosto sabe, só que cansei de criar expectativas e você destruí-las apenas com uma palavra.
Você não quer que eu lhe diga que foi bom enquanto durou e que o problema não é você não é? Você sabe que eu não consigo ser falsa a esse ponto e que mentir nunca foi o meu forte, então, por favor, não me peça para ficar, pois eu não vou.
Caramba menino cadê o seu orgulho, a sua capacidade de manter a cabeça erguida e de se fazer de durão, cadê aquele garoto que não ligava para o que eu fazia da minha vida e que sempre deixou bem claro que eu nunca ia te fazer abalar?
Sinceramente?! Não esperava essa sua reação, isso não muda a minha decisão, acabou, não quero mais e ponto final.
Fica com o meu beijo e tchau!

terça-feira, 19 de junho de 2012


E eu gostava de você, sentia saudades imensas... Não, não é mentira é a mais pura realidade, pode perguntar para qualquer um que convive comigo, o seu nome não saia da minha boca, só que você sempre foi inconstante comigo, era como se valesse só a hora que você queria, depois tchau e benção.
Com isso eu fui criando certo receio sobre você, ao mesmo tempo em que eu queria ir correndo te ver quando me ligava ou mandava uma mensagem eu tinha medo, algo já não estava normal, e eu simplesmente cansei de sentir saudade sozinha.
Você exerce uma força sobre mim que não sei te explicar, mas sei controlar.
Nesse meio tempo em que você ficava comigo quando desejava, quando tinha vontade e depois desaparecia eu fui conhecendo uma nova pessoa, ele não, nunca foi e nunca será você mas ele sempre mostrou se importar comigo, querer o meu bem e a minha presença sempre que viável... E eu fui me deixando envolver pela forma que ele me tratava – me trata – e eu fui me acostumando mal e eu fui me acostumando, me adaptando a ter alguém do meu lado o dia inteiro, a noite inteira, alguém se preocupando comigo e decidi então me dar uma chance com ele e foi isso que aconteceu – que está acontecendo.
Sempre fui meio assim dependente de carinho e atenção integralmente, sempre gostei de alguém no meu pé moderadamente e ele fez o que eu queria que você tivesse feito comigo, mostrou que se importa.

segunda-feira, 18 de junho de 2012

Menino


' Você me deixa meio receosa sabia?! Não, não é que eu queira modificar algo entre a gente, é só que você me confunde e muito.
Caramba menino você exerce uma força imensa sobre mim, só que de você talvez eu queira apenas amizade agora, nada mais do que isso. Você poderia ter sido algo a mais do que isso sim, lá no começo, se lembrasse de mim nos finais de semana e não só naqueles momentos em que se sentia só em sua casa e me ligava querendo me ver. Você só passou a perceber mais a minha existência quando eu deixei de querer fazer parte da sua vida, quando deixei de querer cuidar de você...
Está bem eu confesso, não vai ser fácil me afastar assim de você, mas eu já venho preparando o meu psicológico para isso há alguns dias e por enquanto isso está funcionando. O problema é que eu começo a pensar que poderia ter dado certo se você tivesse a capacidade de ter gostado de mim no mesmo momento em que eu gostei de você, em que eu largava as outras coisas que eu estava fazendo para ir naqueles seus shows de rock que eu não suporto só para ficar te olhando de longe, naqueles dias em que eu te enviava um sms dizendo que eu queria te ver e estava com saudades, daí se você tivesse respondido: “também estou, posso ir te ver?” já seria mais do que suficiente para talvez colocar o meu coração em suas mãos e te dizer vamos tentar ser felizes, só que tem que ser juntos, de hoje em diante até a eternidade topa?!
Antigamente os seus raros momentos de afetividade para comigo já eram válidos, já me faziam se sentir bem, mas daí aconteceram várias coisas em minha vida e eu fui aos poucos abandonando aquela parte da minha vida em que eu fui apresentada à você, fui deixando de lado aqueles amigos e prestando mais atenção em mim, a que tipo de pessoa eu queria ao meu lado na minha vida e você foi se tornando obsoleto.
Você menino, não é mais um menino há muito tempo, só não perdeu essa essência ainda e o meu problema é ter cansado de gostar de meninos e querer um homem ao meu lado.
E esse homem veio, e por mais que no dia em que ele surgiu em minha vida ainda existisse em meu subconsciente um pouco de vontade para que você se tornasse ele isso não ocorreu, você continuou o mesmo menino que eu conheci, que eu acostumei mal com tanto carinho e atenção, só que tudo entre nós sempre foi unilateral, vinha apenas de mim, de você só surgia nas suas crises substanciais de falta de afeto por parte dos outros, momentos esses que eram raros, eram sim, pois você não faz mais parte de mim, do meu pensamento, cansei do menino, decidi apostar no homem.
Não precisa vir me dizer que eu estou conturbando seus pensamentos com isso, que agora você descobriu que realmente valia a pena apostar em mim, em nós... Eu não quero mais mesmo, e essa ultima noite nossa foi só para eu ter certeza de que você realmente não é o homem da minha vida e sim apenas mais um menino que passou por ela e de meninos já estou saturada a algum tempo, mais precisamente desde que deixei de ser menina para me tornar mulher e mulheres gostam de homens, não de meninos, a não ser que sejam seus filhos ou irmãos.
Me tornei mulher e continuo com a aparência de menina, enquanto você menino, de homem só tem a aparência, nada mais, nada menos do que isso.
Não é que eu esteja com esse meu sentimentalismo tão barato que nem sei o que dizer ou sequer fazer nos últimos dias.
Minha mente fervilha e eu não sei traduzir o que sinto, o que realmente quero.
Não sei de quem sinto falta, quem realmente amei ou amo, talvez eu nem saiba de verdade o que é esse sentimento.
Amor é complicado, fica naquela linha tênue com a realidade que eu nem sei mais onde se encaixa em minha vida.
Apenas acho algumas coisa, convivi com paixões, acho que é isso, na verdade... Não acho nada.

sexta-feira, 15 de junho de 2012

Parecia que ia chover. O céu estava nublado, cinza, e a lua refletia através das nuvens. Ela desceu no centro da cidade e esperou no lugar marcado. Poucas pessoas passavam, olhando-a de longe, através dos vidros dos carros e dos capacetes das motos. Alguns minutos, ele chegou. Subiram uma ladeira escura, adormecida, com lojas e casas comerciais que pareciam ter levado chuva há poucos minutos. Ninguém na rua - talvez um ou dois grupos de pessoas pelas esquinas. Passaram por uma praça bem ornamentada, com bandeirinhas coloridas penduradas pelas árvores, pelos postes e telhados das casas. Dobraram à direita, numa rua cheia de casas coloridas e no mesmo formato (baixas e retangulares). As ruas molhadas, a vizinhança adormecendo, e eles entrando no grande condomínio deitado.

Numa casinha amarela de teto baixo eles entraram por uma grade e lá dentro ela descobriu que aquelas casinhas reservavam condomínios inteiros, como se fossem grandes prédios deitados. Caminharam por um longo corredor e subiram dois lances de escadas. Passaram por grades fechadas de luzes acesas nos apartamentos dos corredores, até chegarem ao último da fila. Um degrau dividia o chão da entrada do apartamento e ela entrou primeiro. Sentou-se na cadeira do computador, enquanto ele preparava a bebida. Serviu-a num copo pequeno e enquanto preparava um prato com batatas em conserva, limões e pepinos cortados em pedaços, ela o observava. Ele deve saber tanto sobre si mesmo, morando sozinho por tanto tempo, pensou ela. Tomou um gole do líquido transparente, forte, bom. Ele serviu o prato na mesa onde ficava o computador e pôs um disco para tocar. Ela olhou ao redor da pequena sala, que também servia de cozinha. Uma grande estante de livros tomava o lugar da parede que dividia a sala do quarto, um sofá estava ao lado da mesa de trabalho, onde ficava o computador. Ele sentou-se no sofá. Conversavam sobre literatura, ele mostrava suas relíquias, livros antigos e coleções clássicas de histórias em quadrinho. Nomeavam escritores, desenhistas, quadrinistas, poetas, e grandes figuras da geração beat.

Nem mesmo quando ficavam em silêncio era desconfortável. Não sabia se era a bebida, mas ela sentia-se mais em casa, na casa dele, do que na própria casa. O telefone dele tocou, e em pouco tempo um garoto nerd de camiseta branca entrava na sala-cozinha. Ela cumprimentou-o, ele serviu mais uma dose da bebida para o garoto nerd de camiseta branca, e eles conversavam - agora, sobre música. Enquanto ela bebericava ainda seu primeiro copo, ele já ia no segundo. O nerd de camiseta branca rejeitou o líquido transparente, e às dez horas e alguma coisa, os três deixaram a estante de livros, os pepinos, as batatas, os discos, as grades e os prédios deitados.

Ao dobrarem a esquina de uma rua asfaltada, subiram a ladeira que formava a praça principal do centro histórico da cidade. Casas coloridas e não molhadas estruturavam-se nas laterais da praça, e vários rostos, sons e carros movimentavam o lugar. Música, conversas, risos e sons de vômitos perpassavam por eles enquanto subiam à esquina e encontravam um casarão rosa com vários grupos de pessoas na frente. Pessoas, garrafas de vidro e plástico, copos grandes e pequenos saiam e entravam da casa rosa, que servia de casa de shows e bar. Os três - ele, ela e o nerd de camiseta branca - se sentaram numa mesa de plástico amarelo e conversas estranhas, idas ao banheiro e copos com cerveja aconteceram naquela mesa, naquele lugar, por algumas horas.

A noite acordou, o céu estava limpo e a lua incandescia os postes de luzes amarelas. Os três conversavam, a maior parte do tempo, sobre música e sexo. Era interessante conversar sobre experiências masculinas, pensou ela. Sempre é, porque você pode aprender muito com eles. Tanto que tudo o que você sabe veio disso. Os ponteiros cercavam os números nos relógios e o tempo escoava pelas cervejas quentes derramadas e piolas de cigarros jogadas no chão, carregadas pelo vento até o fim das ruas. Ela queria muito ir ao banheiro. Exatamente na hora que uma garota estava saindo da casa rosa de esquina, ela entrou. Mijou por muito tempo, saiu, lavou as mãos e caminhou de volta à lateral da casa, onde estavam seus amigos.

Não sabia por qual motivo, mas estava com a frase "Afinal, somos amigos" na cabeça desde que os convidara para curtir uma noite juntos. Há algum tempo não faziam isso - complicações não permitiam que os três se encontrassem e ficassem juntos, numa roda de conversa natural, normal - coisas que não vinham ao caso naquele momento, nem precisavam ser relembradas. Não chovia e não fazia calor - estava um clima agradável na noite e entre eles e naquela parte histórica do centro da cidade, até mesmo nas bebidas. Somos amigos e estamos curtindo uma noite agradabilíssima, pensou ela. Apenas isso.

As horas cresciam e a noite começava a ficar com sono, e quando as três horas da manhã chegaram, eles decidiram voltar para casa. O nerd de camiseta branca foi no caminho contrário, enquanto eles iam pelo mesmo caminho que chegaram. Não davam as mãos, apenas conversavam - sobre a noite, o centro, as prostitutas, os bordéis - e música, bebidas, literatura, até chegarem novamente ao apartamento dele.

Como as coisas devem ser, sem nenhum beijo roubado ou surpresas, eles entraram no quarto. Ela não viu nada da mobília, apenas deitou na cama e deixou que ele tirasse sua roupa.



Amanhecia e o sol fraco das seis da manhã entrava pela cortina da janela acima da cama. Ela levantou-se, foi ao banheiro e mijou por quase dez minutos. Ele acordou e ficou olhando-a nua caminhar pelo quarto. Confortável, era a palavra que vinha à mente dela. Não tinha vergonha de ficar assim na frente dele - esse sentimento, na verdade, ela já o perdera há algum tempo. Mas especialmente naquele apartamento ela sentia como se estivesse no próprio quarto, com todas as suas coisas - coisas que faziam parte dela, não só eram dela. Ela sumiu da vista dele quando dobrou na esquina da estante de livros. Completamente nua, ela lia os nomes e títulos dos livros no último andar da estante, quando ele abraçou-a forte pelas costas e deu-lhe um beijo na nuca.
- Quer café?
Ela assentiu.
Colocou água num bule antigo, enferrujado, que em poucos minutos já estava apitando. O café estava forte e ela sentou no sofá, enquanto ele desaparecia atrás da estante. Voltou carregando um violão marrom, de cordas de aço, e deixou o instrumento ao lado dela, no sofá. Serviu o café em duas xícaras e entregou-lhe uma. Sentou, tomou um gole, colocou a caneca na mesa e pegou o violão.

Ela pensou com quantas meninas ele fez aquilo. Pensou em quantas devem ter passado pela vida dele, pela cama dele, suado sobre o corpo dele. Então pensou que aquilo realmente não importava, e percebeu que para ele, todo momento é um momento. Percebeu que, para ele, toda mulher é diferente e todo momento passado com cada uma delas é único, do jeito que deve ser. Cada pessoa tem sua especialidade, e aquela era a dela - sentir-se confortavelmente nua tomando café e vendo-o dedilhar no violão uma bonita e delicada melodia.          

O calor do café esquentava seu rosto, e a vizinhança começava a acordar. O sol entrava pelas janelas, através das cortinas. Eles continuaram ali, sentados, nus, um de frente para o outro, bebericando café e entornando músicas antigas num violão antiquado.

Memória afetiva

Porque a gente tem que ser tão carente? Porque a gente tem que depender tanto dos outros? E não só dos outros, mas do tratamento que os outros dão para a gente. Porque a gente tem que ser tão dependente de beijo, de abraço, de carinho, de cafuné, de dormir agarradinho? Porque a gente simplesmente não encara isso com a maior normalidade, como se não fosse nada demais, só o mesmo de todos os dias. Porque nos falamos com nossos pais, damos bom dia para o porteiro e obrigado ao motorista do ônibus na maior naturalidade, e quando alguém te dar uma gota de carinho qualquer, nós levamos a sério? Nós ficamos feito loucos, atordoados, pensando naquela pessoa, nas ações dela, nos benefícios que ela pode trazer pra nós... Sem falar nas horas perdidas imaginando os dois juntos, a troca de carícias, as lembranças das conversas, dos toques, dos simples gestos... Porque isso acontece? O que faz isso acontecer? E porque temos que levar tão a sério? Porque, afinal de contas, temos que depender tanto desse tratamento?

Sei lá se essa porra se chama amor. Pra mim é mais carência. Amor é algo mais profundo, mais da alma. Por exemplo: fica fácil dizer "Eu AMO essa banda", porque, de um modo ou de outro - dependendo do seu estágio de conhecimento dela, ou da frequência que a escuta - você realmente ama aquela banda, aquele som, aquela música ou aquele disco. Porque ela (a banda) já vem te acompanhando há algum tempo na vida, te ajuda a passar por situações ruins e boas, e quando você escuta as músicas de tal banda, sempre atiça a memória afetiva (e vem aquelas lembranças dos momentos com aquela música e tudo mais). Mas, o que acontece no nosso cérebro quando a gente simplesmente sente falta de dormir de conchinha com alguém? De abraçar e beijar alguém que a gente gosta? De conversar com alguém, mesmo que esse alguém seja de longe? Sei lá que porra é essa, mas só sei que eu tô sentindo, e até demais.

É uma merda gostar. Não sei qual é o pior: admitir que gosta ou ficar sentindo falta. Talvez, quando a gente admite que gosta, nosso cérebro entenda como "coisa séria", e comece a lhe dar altas restrições. Tipo: você não pode sair no sábado a noite, ficar bêbada e pegar dois, três guris na mesma noite porque você já DISSE A ELE que gostava dele. Daí seu cérebro meio que faz uma aposta acirrada com as partes sexuais do seu corpo, criando aquele ~climão manero~ entre a dúvida se faz isso descrito acima ou fica em casa, passando a madrugada conversando com o guri no MSN. É, talvez o compromisso que você assume consigo mesmo (em dizer pro garoto que está apaixonada por ele) seja pior do que sentir falta.

Ou não. Sentir falta também é uma merda, porque está acima dessas decisões que você combina com seu cérebro (ou com o garoto). Porque você pode até pegar cinco numa noite só, chegar em casa suja e ainda bêbada, cair na cama e dormir até nunca mais... Mas quando você acorda no outro dia, será aquele carinho na cabeça, aquele abraço apertado, até aquele entrelaçar de mãos que parece não querer soltar nunca, serão essas coisas que vão fazer falta. E isso, sim, é pior do que qualquer coisa - até mesmo do que o compromisso com alguém que está há 1.200km distante de você.

Aí eu me pergunto, novamente: porque a gente é tão dependente disso tudo? Porque a gente simplesmente não encara tudo na maior naturalidade, e deixa a vida seguir? Bem, talvez a resposta pra isso tudo seja: porque simplesmente essas coisas não acontecem com a gente todos os dias. Porque, se acontecessem, perderiam a graça - e aí deixariam de ser especiais. E são esses momentos especiais que formam nossa personalidade, caráter. São pequenas coisas assim que marcam nossas vidas, e as fazem valer à pena.

Para o bem ou para o mal, carência ou amor, bandas ou guris, o que importa é que quando uma coisa nova acontece na vida da gente, mesmo que a gente não tenha chance de alcançá-la de primeira, mesmo que tudo seja distante e difícil demais, no final vai valer mais a pena do que o que a gente esperava. Afinal, gostando ou amando, é assim que a gente vai crescendo, vivendo e aprendendo. E assim será a vida (daqui até a eternidade).

Do vício por música

Saiba você que, em alguma parte do mundo, haverá alguém ouvindo algo que não é desse século, ou lançado semana passada. Saiba você que, em qualquer lugar do mundo, haverá alguém ouvindo algo muito antigo com a mesma eferverscência que você está ouvindo aquela banda que lançou o primeiro disco ontem. Saiba que, em qualquer lugar que você for, vai encontrar alguém que deteste seu próprio século - em matéria de música - e, por isso, só escuta o som do tempo que vivia-se nas ruas cheirando pó, tomando LSD e indo a shows do Velvet Underground. Saiba que, em qualquer lugar do mundo, haverá alguém que irá provar por A + B que aquela sua nova banda preferida é, na verdade, uma merda. E ela vai te convencer, mas isso não vai te fazer parar de ouvir a banda. Porque, quer queira quer não, música é sentimento. E se ela te pega, por pior que seja (ou por mais que te convençam que ela não presta), não haverá saída. Porque gosto é gosto, e, algumas vezes, eles não são feitos para discutir.

Saiba você também que muitas discussões sobre música vão acabar com "Isso é uma merda" contra "Isso é muito bom". Mas isso, é claro, vai depender de banda, de disco e de época. 

Saiba que, em alguma parte do mundo, haverá alguém ouvindo nada - ou ouvindo o silêncio, apenas. Saiba também que há uma diferença entre ouvir o silêncio e não ouvir nada: a falta de música não significa que você não a está ouvindo. Afinal, mesmo que você escolha ficar no silêncio, ainda haverá música dentro de você, tocando sem parar, como uma vitrola que nunca desliga. A diferença é que, na vida,  você pode desligar o rádio. Já na cabeça, não é tão fácil assim se desligar da música.

Saiba que, não importa se no Brasil ou na Europa, Estados Unidos ou Japão, haverá alguém sempre com a cabeça cheia demais, pensativa demais, viciada demais para ouvir com cuidado, e absorver música. Ou simplesmente ocupadas demais para despertar o mesmo interesse que o seu sobre música. Entenda que essas pessoas estão interessadas em outras coisas - e que o mundo é maior do que a discografia do Bob Dylan que você acabou de baixar tão facilmente. 

Saiba que, não importa que álbum você escute, se ele foi lançado em 69 ou ano passado. O que importa é a energia, a vibe que você sente ao ouvi-lo. Saiba que música não precisa ter época. Música precisa ter feeling. E se você sentiu aquilo enquanto ouvia aquelas guitarras rasgadas, ou aquilo outro quando escutou aqueles pianos delicados, aconteceu alguma coisa. E, quando você menos espera, está lá, viciado em música.

Música que importa, que faz sentido. Que importa mais do que qualquer coisa nesse mundo.

Anti Social

Preciso te dizer que eu sou anti-social. Não gosto quando recebo visitas em casa. Não gosto quando alguém da família chega para "tomar um café" e fica até a hora do jantar/almoço. Aliás, essa situação eu tento evitar ao máximo na minha vida. É uma das piores de todas, pra mim: receber familiares em casa e ter de aguentar todo aquele lero-lero porre de família, porque Fulaninho fez isso e não deveria ter feito, porque Sicraninho está aprendendo a andar de bicicleta, porque Doninha está grávida de novo do terceiro filho... Por aí vai.

Papos assim nunca vão funcionar comigo, até quando é família de outra pessoa e algumas histórias parecem até ser legais. Mas não adianta: logo eu perco a paciência e tento desviar, de todas as formas, o assunto para algo que realmente interesse. Claro que assuntos assim não aparecem o tempo inteiro. E pior: eles nunca surgem naquela hora certa, exatamente quando você dá de cara com alguém que não tem o quê conversar com você. Nessas horas, o "assunto interessante" sai correndo longe e te deixa lá, vazio e sem esperanças, ansiando para que aquele momento passe.

Um dos lugares-comum que mais acontece esse tipo de impasse é em paradas de ônibus. Lá está você, ouvindo música no volume máximo, com seus novíssimos fones de ouvido, quando de repente chega aquela pessoa que você conhece, mas não conversa. É teu colega, estudou contigo em algum cursinho ou escola da vida, e de repente surge na tua frente com o maior sorrisão, pronto pra te cumprimentar como se vocês fossem amigos de longa data. Cara, isso não funciona. Ele pode até te abraçar com maior fervor, mas depois do "E aí, com você está?", a situação só tende a piorar.

Aqui, o lema de "na dúvida, fale sobre o tempo" do Takeda não funciona. Porque esse é aquele tipo de situação que você mexe nos bolsos, troca o peso das pernas, olha para cima, para baixo, para todos as laterais (numa forma desesperada de evitar o contato olho-a-olho com o indesejável ser ao seu lado), e solta aquele sorrisinho: "então...", visivelmente mostrando o quanto você quer dar o fora dali e seguir sua vida. São momentos que te atrasam, quase dando um imprevisível e incômodo Pause no ritmo de vida que você estava levando. A vida para do que estava fazendo antes ou pretendia fazer naquele instante para ser interrompida por uns dez, vinte (oh, meu deus) quarenta minutos  por alguém que não tem nada para falar com você.

Porque, na boa, convenhamos, falta de assunto no meio de uma conversa (ainda mais dois a dois) é uma das piores situações já criadas pela humanidade. E aí o único jeito é ficar preso as piores tentativas de engatar numa conversa, ou se perder nas esparsas amenidades tipo "como vai a faculdade?" "trabalhando, já?" "como vai o namoro?"... Daí para baixo.

Deste modo, eu me torno sócia do clube dos anti-sociais. Porque, sério mesmo, entre encontrar uma "persona non grata" e ouvir música sozinha na parada de ônibus, eu prefiro muito mais aumentar o volume e deixar que o John  Lennon exploda meus tímpanos (com o Walls & Bridges, de preferência). Aqui, o verdadeiro lema é do mestre Bukowski: "Não é que eu odeie as pessoas. Só prefiro quando elas não estão por perto".

Com sono


Os primeiros raios da manhã atravessavam as janelas de vidro pintadas de vermelho e verde, refletindo formas irregulares sobre a mesa de madeira lotada de papéis rabiscados. Entre canetas e copos de café, cores e formas irregulares se espalhavam por cima da mesa, terminando por incidir sobre o cabelo dourado da menina. Ela tinha dezessete anos de noites em claro e sete de manhãs com sono.  

O quarto era só silêncio e suspiros. Deitada sobre o braço em cima da mesa, ainda segurando a caneca de café, ela adormecia entre pequenos montes de papéis com contos inacabados, rabiscos de desenhos incompletos, frases e palavras sem nexo. Por mais profundo que parecesse seu sono, não duraria muito – tanto que, logo quando sentiu o calor do sol na cabeça, acordou num susto. Entreabrindo os olhos e tentando não se mexer (para não perder o filete de sono), ela levantou da cadeira de madeira e caiu por cima das almofadas do sofá cama.

Tentava, desesperadamente, adormecer de uma vez por todas – por duas, cinco horas ininterruptas. Nunca conseguia. Estava nessa rotina dormente há pelo menos sete anos, desde que... Não gostava nem de se lembrar. As luzes vermelhas piscando voltavam a sua mente com força, e ela tentou desviar o pensamento colocando um travesseiro no rosto – empatando o sol.

Não adiantou. Como se vivesse o roteiro da mesma peça todos os dias, automaticamente e sem nenhuma expressão, ela se levantou e foi à cozinha, preparar um café. Voltou com a caneca soltando vapor, e mais uma vez se sentou à mesa. De frente para a máquina de escrever, ela fitava a manhã nascer lá fora, através das suas janelas de vidro verde e vermelho. Soltou um suspiro profundo, e na tentativa de tentar organizar (pela enésima vez) seus pensamentos, bebeu um gole de café, deixou a caneca de lado e pôs-se a digitar na máquina de escrever.

Dialogava o tempo inteiro com a página em branco. Escrevia uma linha, não gostava. Tirava o papel e amassava. Então escrevia outra, gostava e continuava. Mas no segundo parágrafo, desistia. Pegava o papel e tentava escrever a mão. Não funcionava. Não sabia por qual caminho seguir. Era difícil se decidir. Sentia tudo ao mesmo tempo, e imaginava fotografias, falas e diálogos soltos, sem nenhuma conexão um com o outro. Perdendo a paciência, se levantou da mesa e pegou sua caneca. Decidiu colocar música para tocar. Gostava de ouvir música clássica pela manhã – Bach ou Beethoven. Seu avô, falecido, dizia que música clássica ajudava os neurônios a trabalharem melhor. “Em sincronia”, dizia ele. Ela acreditava, e colecionava CDs de coletâneas com os maestros mais famosos do mundo.

Deixou que a Nona Sinfonia  fosse quebrando o silêncio do quarto em pequenos pedacinhos de orquestra, adicionando instrumentos aqui e ali, aos poucos aumentando de volume e grandiosidade. Nessa parte, ela não conseguia evitar o sorriso, e dava ritmo a seu passo por dentro da pequena casa. Agora a manhã já ia acordada, assim como seus vizinhos, que começavam a varrer os pequenos jardins, tapetes e calçadas em frente ao dela. Decidiu pôr um vestido e sair de casa. Do lado de fora, observou as seis casinhas coladas uma na outra, emparelhadas, diferentes apenas pelas cores: azul turquesa, azul clara, rosa forte, lilás e roxo. Nas duas primeiras, um senhor de idade e uma senhora de vestido florido bem usado varriam a frente das suas respectivas casas. 

Ela deu bom dia ao casal de melhor idade, e encostada na lateral da porta, terminou seu café. De repente, olhando para a divisão da sua porta - da sua casa - para a vizinhança, decidiu que não mais iria tentar dormir aquela manhã. Exatamente quando ela entrou de volta em casa, a Nona Sinfonia tinha seu momento mais clássico, em que um coral feminino toma a vez dos violinos. Assim, com um sorriso no rosto provocado pela música, ela decidiu finalmente se organizar.

Começou abrindo todas as janelas, deixando o apartamento arejado. Então foi direto à mesa de madeira, pegando de bolo todos os papéis que saberia que não mais iria usar - estavam ali apenas fazendo volume desnecessário. Enquanto arrumava suas coisas, o disco na vitrola tocava, atraindo olhares até mesmo dos vizinhos. "A Lisa acordou disposta hoje, ein, Harold?" comentou a senhora da casa azul clara. "É verdade. Tá até com as janelas todas abertas!" concordou o senhor da casa azul turquesa.

Lá fora, a manhã já ia disposta, e pela primeira vez nos seus dezessete anos de insônia, Lisa passava uma manhã sem sono. 

Romance antigo

Havia um deque largo e longo, suportando de uma ponta a outra o mar que insistia em tentar derrubar as toras de madeira fincadas na areia. Havia ondas, pequenas, que hora e outra soltavam espumas brilhantes, quase colocando formas estranhas para fora d’água. Havia aquela fileira de barracas recheadas de frutas de todos os tipos, havia lojinhas de suvenirs, artesanatos, brechós e livrarias esperando uma merecida visita mais demorada.

Havia bancos de madeira a cada cinquenta metros, virados para o mar, onde os casais se abraçavam. Era fim de tarde, apesar de ser muito tarde no meu relógio e o sol ainda causticava os rostos rosados dos homens e mulheres que por ali não paravam de ir de um lado para o outro. Ali, os séculos não passavam, o mundo não girava: como se o lugar, as pessoas, quem sabe até o clima frio e seco estivesse preso nos anos 50. E eu também estava lá.

E haviam as pessoas. Sofisticadas, ricas, bem vestidas. Mas também pobres e maltrapilhos. Casacos de pele e grandes cartolas caminhavam vagarosamente pelo deque, ignorando os muitos idosos sentados no chão, implorando por comida ou dinheiro. Vez ou outra, crianças corriam entre as pessoas, e um senhor bem vestido, de monóculo e relógio de bolso, gritava da porta da sua lojinha: “Pega ladrão!  Pega ladrão!”.

O cenário era agitado, mas as situações eram cotidianas: todos os dias, aquelas mesmas pessoas passeavam pelo deque ostentando suas riquezas, os mesmos velhos pediam dinheiro, as mesmas crianças corriam e os mesmos senhores chamavam a segurança do local para denunciar um furto. E todos os dias, casais se encontravam nos bancos de madeira, assistindo o sol se deitar no mar.

Assim, lá estava ele, sentado. Vestia um casaco e uma touca de lã cobria suas orelhas. Tinha as pernas sentadas por cima das mãos e balançava os pés como uma criança brincando no balanço. Lá estava ele, esperando. Era tão lindo.

Caminhei pelo deque, esbarrando nas pessoas, observando-as, procurando me distrair. Mas ele me hipnotizava. Homens lindos passavam por mim, olhavam para mim e sorriam timidamente. Eu só conseguia responder com um aceno de cabeça e seguir em frente, ao encontro dele.

Cheguei mais perto e toquei-o no ombro, num gesto que foi correspondido automaticamente, quando ele virou e sorriu para mim. O sorriso dele brilhava. Ele levantou-se, deu a volta no banco e parou à altura dos meus olhos. Sem dizer palavra, me abraçou, me desligando por completo da multidão transeunte atrás de nós, trazendo toda paz e felicidade de volta.

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Há tempos que não escrevia algo assim. Precisava me recuperar, ver se minha veia literária e descritiva ainda funcionava comigo. Pelo jeito sim, mas ainda há alguma coisa faltando - um mote principal pra cada história. Descrições e adjetivos já não fazem mais tanto sentido, mas ainda é um bom (re)começo.
Em uma destas madrugadas solitárias, sentei entre as páginas da minha vida. Elas estavam ali, todas espalhadas pelo chão do meu quarto, assim como as folhas que colorem o cinza da rua em seu outono. 
Não havia ninguém. Apenas eu e.. o que de mim escrevi. Os parágrafos pelos quais corri, e até aqueles que andei bem devagar, quase parando, evitando chegar ao final. Vi as partituras que certos dias me silenciaram, outras que de mim fizeram rio, e até aquelas que romperam as fronteiras da normalidade, e me fizeram um ser desatento, cantarolando por entre asfaltos e sorrindo para horizontes que só eu via. 
Parei diante das páginas dobradas, um pouco escondidas, logo abaixo de certos poemas. Ao abri-las, como um raio as lembranças vieram, e eu não sabia mais o porquê de estar alí. Não entendia porque continuavam firme e fortes, estendidas no meu chão, mesmo depois de tê-las confinado no fundo daquele precipício, dentro de mim. Mergulhei. 
E nisso, percebi-me em sorrisos, pretérito perfeito. Mais-que-perfeito. Porém, pretérito. 
E ele, como presente, alegra. Faz com que jogadas de cabelos desengonçadas te façam ficar linda, e se sentir bem. Muda qualquer problema banal do seu cotidiano, e o faz acréscimo. No sorriso. Nada importa, nada deve importar. A vida torna-se um soneto, a pagina de linhas perfeitas e calculadas, fazendo com que você sinta aquele gosto de novidade na boca, e aquele anseio por mais no coração. É divino. 
É passado. E como tal, prefere lanhar. Apontar os erros que te deixam com saldo negativo, e nunca mais como apenas mais uma maneira de ser feliz. Prefere deixar uma miniatura na sua cabeça, que cresce mais e mais a cada dia, e você sabe que virará um problema. Já é um problema. Um arrependimento, um desentendimento. Uma daquelas simples maneiras que a gente sempre acha para tentar se resolver, mas acaba piorando tudo. Apenas pelo simples fato de tentar fazer sumir o que foi bom, o que te deu vida. 
Não queria mais. 
O passado como presente é sorriso. O presente como passado.. a sua lembrança. O seu oposto. Passou.
E no meio das folhas, recordo: sou mar. 
Passado-sorriso, vire barco. Um frágil barco de papel. Ganhei uma frota de sonetos.
E pelas esquinas de algum lugar desconhecido, achei um rio. 
Siga, frota. Siga.
Seja o sorriso de quem te lê por fora, 
E não vive a sua ultima estrofe.
Você veio mais uma vez, com toda a sua doce melodia de verões passados, e disse que sentia falta das minhas palavras. Olhou-me com aqueles olhos virtuais, perdido no espaço que separa os ponteiros do nosso tempo, e pediu que eu escrevesse. 
Poderia ser sobre qualquer coisa mundana. Explorar as eternas voltas do ventilador que, só de olhar, me deixam tonta – ou quem sabe a tontura que sinto quando as nossas palavras se chocam. Poderia falar sobre a chuva que alaga a cidade, ou até de quando os seus pensamentos alagam os meus. Deixo esse trabalho contigo. 
Mas, nesse texto farei diferente. Dissecarei aquilo que tanto o assusta. 
Meu querido, querido meu. Falemos sobre o nada. 
Ele é tão complexo, mas tão complexo, que nunca sei quando está vazio de coisas cheias, ou cheio de coisas vazias. Não sei diferenciar se é o tudo que foi embora, ou se é uma incógnita invisível aos meus olhos, porém nítida ao meu futuro. Não sei se é aquilo que não posso ver, não sei se não quero ver. 
E continuando com todas essas verdades, aquelas que sonham vivendo em epifanias, rondam a minha mente, o meu mundo. É independende de qualquer opinião minha,é imune a qualquer ataque. 
Você, meu amor, teme o nada. Você aperta forte a minha mão para ter certeza de que está atravessando a rua comigo, e não com qualquer ilusão de ótica ou alguma outra pessoa . Você teme descobrir que, mesmo cercado, não se pode escapar do nada; Não se pode escapar da estrada que o nada mostra, do caminho que vai te acolher. 
O nada para você é furacão. É falta de planejamento, é correria, é.. nada. 
O nada é tudo isso.. mais presença. Uma equação simples, um sorriso discreto. 
O nada é você evoluindo, é a sua caixa vazia – cheia de coisas ausentes, mas ali. 
O nada é a sua volta, depois de qualquer presença. Mais a sua presença. Mais confusão. 
Em si, o nada tem a sua importância. E você, meu amor, abra a janela em respire seu ar. Olhe para baixo e veja os traços das suas opções correrem pelo chão, e agradeça ao nada. 
Ele lhe fez ver alguma coisa, se não o nada. Fez-lhe dar valor aos nossos jogos de pernas, aos sorrisos por baixo do cobertor. Fez você brilhar em olhares secretos por segredos sussurrados em esquinas, por abraços repentinos em ruas lotadas, por uma companhia em meio a solidão da madrugada, por todo o salto de vida que a gente quer viver. 
Esse é o nada, e ele te fez tudo. Tudo que você é, tudo que você vê, tudo que é para mim. Brindemos a isso !

segunda-feira, 4 de junho de 2012

Desiste

Eu sei onde você quer chegar. Olha, vou ser honesta contigo, algo me diz que você merece. Eu não sou interessante. Você entende? Sei como é, só porque eu sou bonitinha, eloquente e meio exótica, com seus olhos você enxerga uma garota inteligente, divertida, culta, impressionante, talvez boa de cama. Eu não sou nenhuma dessas coisas. Eu não tenho graça nenhuma.
Falo sério. Talvez eu até mereça essa sua atenção momentânea, mas em longo prazo sou uma garota que não funciona direito. É como se eu fosse uma vitrola antiga, com a agulha defeituosa. Se você parar para prestar mais atenção em mim, vai se dar conta que eu fico roçando no vinil e atrapalhando a música, provocando aqueles ruídos que dão agonia nos dentes. E sabe o que é pior? Eu não tenho conserto, não há peças de reposição no mercado, sou uma causa perdida. Por que você não abraça uma árvore? Vai dar na mesma.
Gostar de mim mesma não é autoestima, é humor negro. Sou realista, não passo de uma boboca vazia e sem glamour. Meu corpo faz umas promessas que meu cérebro não pode cumprir. Eu sou burra, gosto de novela e comédias românticas, não leio Sartre e esses troços.
Não é só isso. Aí do outro lado você deve estar me imaginando de calcinha e camisetão da Janis Joplin até as coxas, fazendo as unhas do meu pé, no sofá, cheia de esmaltes coloridos espalhados em volta, com aquele separador de dedinhos e tudo. Você deve achar que eu fico bebendo Carménère e escutando Ella Fitzgerald pela casa, na escuridão. Parte da sua admiração são essas visões sexies que você tem. Quer saber, sabe qual foi meu jantar? Pão, café-com-leite e banana. E agora estou usando uns óculos que tapam metade da minha cara. E aí, o que você acha?
Eu fico aqui pensando, que problema mental será que você tem pra gostar tanto assim de mim. Inábil, patética, dentes tortos, e de cabelos oleosos. O próprio bicho-do-mato. Na escola, quando eu tinha uns 14, fizemos uma viagem de final de ano para o Chile, e eu gostava de um menino. Perguntei se ele ficaria comigo e ele disse que sim, claro, se o nosso avião fizesse um pouso forçado na Cordilheira dos Andes ou coisa assim. Sempre que um cara diz que gosta de mim, acho que ele está zoando comigo. Sério, a última pessoa que ficou arrebatada por mim foi o dono de um circo, ele disse que tinha uma atração para mim, se fosse embora da cidade com o pessoal. Eu não tenho sal nem sex appeal, eu não sou legal, às vezes coloco um vestido e me revisto umas três vezes por que a roupa parece sempre do avesso. Um dia eu saí na rua depois do banho, fiz uma careta contra o vento e fiquei assim.
Não é que eu não quero me comprometer. Eu agradeço sua atenção, mas estou dando todas as chances pra você desistir. Aceite minha oferta e pense bem, caia fora, garoto. Ou eu não me responsabilizo.